Um presente Divino !

      Quando juntava minha mão à sua, colocando ambas em um dos bolsos de seu sobretudo velho, antigo, já muito fora de moda, eu sentia a segurança e a firmeza que toda criança deveria sentir, a fim de visualizar um futuro suave e despido de qualquer temor. 
      Seu olhar duro, severo, intransigente, explicava em poucos segundos que eu não deveria continuar algo que porventura estivesse fazendo; ele me indicava que ali havia erro, defeito, falha.
     Com seu olhar eu me eduquei. 
     Sua paciência, à noite, na hora de dormir, era infinita, apreciando minhas brincadeiras com as pedras de um velho jogo de dominó sobre o mármore de um pequeno criado-mudo. Somente apagava as luzes quando eu já estava cansado e o sono tomava conta de meu ser.
     Isso para mim, hoje, é um verdadeiro encanto.
     Sentado em um de seus joelhos eu degustava, com prazer indescritível, o pão com manteiga e goiabada que ele mesmo preparava e me oferecia.
     Algumas palmadas e vários castigos serviram de recheio para minha infância. Os castigos, nada exagerados, com certeza nunca sofreram qualquer retrocesso, devendo ser cumpridos rigorosamente. Nunca algo ficava para depois. 
     Nos meus estudos sempre tive seu apoio, nada ficou mal resolvido. Exigia meu interesse  pelos livros e muito estudo.
     Ele era leitor por vocação, lia romances e jornais com uma atenção inigualável. Era autodidata, sua cultura foi forjada sob a luta que empreendeu desde jovem, dissolvendo de forma eficaz a ignorância.
     Culturalmente, foi um grande exemplo para mim. Aprendi com ele a medida das coisas, o respeito pelas pessoas, a cultivar amizades,  a desprezar ofensas.
     Com ele aprendi a aprender.
     Sozinho, com uma força “invisível” como combustível, deu-me chances para viver alegremente na infância, tentando cobrir uma falta que sentimos muito, sabendo que nada, nunca, ninguém conseguiria reparar.
    A verdadeira amizade, o amor total, o companheirismo completo, a energia necessária nos momentos difíceis, a tolerância e a compreensão, tudo isso esse meu amigo me passou não somente pelas palavras mas, também , com maestria , pelas suas ações.
     Há cinqüenta anos não nos vemos, ele já partiu. Mas não deixamos de pensar um no outro um dia sequer.
     Meu pai, um presente divino!

12 de agosto de 2007
Dia dos Pais

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