ROTARY INTERNATIONAL
DISTRITO 4310

III CONFERÊNCIA DISTRITAL

ROTARY E O DESEMPREGO

Governador 1990-91 Newton Colenci


            Prezado Governador Ênio Tavares de Almeida, que representa muito bem nesta oportunidade o Presidente de Rotary International, James Lacy; meu querido Governador Barrichelo; Synemar Cervellini, Reynaldo Russo Ayres; João Carvalho Guimarães; e meu querido amigo Governador Guilherme de Paula do Distrito 4620; meu companheiro de luta Foehd, nós agradecemos as suas palavras que vieram mais do coração, do que na verdade seriam merecidas.
             Recebemos com especial agrado, mais esta missão em Rotary, convidado que fui para participar desta III Conferência do Distrito 4310, denominada “Torne Seu Sonho uma Realidade”, mais pela bondade do nosso querido Governador Barrichelo. Falar aos rotarianos e de um modo particular aos líderes de nossa Instituição, sobre os palpitantes assuntos de inspiração e de interesse de Rotary, tem sido para mim, uma distinção, um privilégio e uma grande honra.
             O Governador Luiz Ernesto Barrichelo, preocupado com o desenvolvimento e a positiva atuação da nossa organização no mundo, e em particular em cada lugar, nos desafiou a falar sobre o tema: “Rotary e o Desemprego”. Recebi a honrosa incumbência como uma excelente oportunidade para o revigoramento de nossas convicções rotárias, para o robustecimento de nossa fé, bem como uma oportunidade de compartilhar com todos aqui reunidos nesse plenário, a uma crença e a nossa visão sobre o assunto que passarei a abordar.
             Segundo a narrativa bíblica, Deus criou o Universo, e a Terra em que habitamos, num período de tempo que corresponde a cinco dias. O escritor do livro do Gênesis observa que no final de cada dia, Deus viu a sua criação, “que era boa”. No sexto dia, Ele criou o homem, feito à sua imagem e a ele, Deus entregou a tarefa singular de tomar conta de toda a sua criação,(Gênesis 1.26 a 28), dizendo o seguinte: “Façamos o homem a nossa imagem, conforme a nossa semelhança: domine ele sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu; sobre os animais domésticos e sobre toda a terra, e sobre todo o réptil que se arrasta sobre a terra.”
             Criou, o homem à sua imagem: à imagem de Deus e a mulher como sua companheira. Então, Deus os abençoou e lhes disse: “frutificai e multiplicai- vos, enchei a terra e sujeitai- a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra”. Encerra o escritor inspirado com estas palavras: “E viu ,Deus tudo quanto fizera e, eis que era muito bom.”
             A mensagem desta passagem é clara. A tarefa principal dada ao homem é tomar conta de, e administrar o mundo, a criação de Deus. É através de sua relação com as coisas materiais com os seus bens, que o homem tem o privilégio e a responsabilidade de demonstrar a sua relação com o Dono de todas as coisas. É através de uma administração hábil e fiel das coisas a Ele entregue, que o homem pode servir à Deus, servindo os outros também !
             Observamos, no entanto, que muitas pessoas hoje encontram, nessa administração, um problema sério. Por falta de iniciativa de sua parte ou por falta de uma compreensão mais clara, deixam de tomar conta, deixam de assumir sua devida responsabilidade. Ao invés disso, são levadas pelas circunstâncias de uma vida desregrada e de repente, vêem-se sob a escravidão das coisas, em virtude de desobedecer, assim, a ordem dada pelo Criador.
             E dentro dessa atitude assistimos a um quadro digno de Dante, destacando, de um lado, grandes multidões de desempregados, ou, como afirmam os economistas, grande freqüências estatísticas, de marginalizados socialmente, quer econômica, quer culturalmente. Figurando, ainda, no outro polo, trabalhadores obrigados a uma sobrecarga de trabalho e uma vida repleta de privações. A miséria campeia e urbaneia. O desemprego constitui um verdadeiro pavor nacional.
            No início deste século, o escritor Lima Barreto apontava “o pavor nacional do dia de amanhã”, o medo, a insegurança e a precariedade, como fantasma dos brasileiros.  Quase cem anos depois, e nas antevésperas de um novo milênio, o fantasma percorre nosso país e se materializa no mundo cão do dia a dia de todos nós; ou pelo menos, da esmagadora maioria de todos nós.
             O signo atual é a instabilidade da situação. O emprego é instável e milhões de brasileiros empregados, coexistem com o terror de perdê-lo. Os desempregados, sub-desempregados e excluídos de todo tipo, vivem ao deus-dará, de uma sorte mesquinha. Um cruzamento de rua, uma discussão de botequim e “pumba”, a tragédia se realiza.
             Desempregado - excluído, talvez tenha hoje o mesmo significado.
             Excluído é toda pessoa, que poderia ser considerado como o nada, ou até mesmo anti-humano, ou, ainda um par de olhos que vê sem ser visto, ou um ator de uma novela que não traz seu nome no elenco. Logo, excluído, deixou de existir há mais ou menos dois anos. 0 desemprego tirou- lhe o salário, a mulher, os filhos, o barraco. Encontrou ao invés da felicidade, a desgraça, e a miséria absoluta deu sentido à sua inexistência.
             Meus amigos, ao iniciar a nossa palestra, certamente alguém indagou no seu íntimo, se Rotary é uma religião, em face das colocações expostas. Responderia, que Rotary poderia eventualmente ser uma religião, pois o Rotary nos liga através das quatro Avenidas de Serviços, ao bom, ao correto, à prática do bem, ao respeito às pessoas, ao companheirismo, ao amor, à paz mundial, nos indica o caminho a uma sociedade perfeita em direção à compreensão entre os homens.
             Os ideais de Rotary já existiam muito antes do seu fundador. Entretanto, foi confiado à Paul Harris,  como um predestinado, à tarefa dada por Deus, de iniciar o movimento para construção da paz entre os homens. Portanto, há 94 anos Rotary, mantém-se íntegro, estimulando e fomentando o Ideal de Servir, como base de todo empreendimento digno, promovendo e apoiando a melhoria da comunidade pela conduta exemplar de um rotariano.
             Porém chegou, para todos nós, a  hora e a vez de ações solidárias. O Rotary deve estar sempre sintonizado com as necessidades históricas do momento. As atividades do Rotary, são relativas a serviços que seus sócios prestam às necessidades existentes do tempo em que se vive. Fazer simplesmente por fazer, seria uma insensatez por não ter objetivos definidos.
             Sem essa “abertura” para as condições de determinada época, o Rotary, em pouco se tomaria caduco e seria tragado pelo torvelinho das forças da inércia, que arrastam para o passado transformando-as em simples memória, aquelas realidades que, atuando em determinada circunstância, não tiveram a sabedoria de se renovarem.
             Ora, qual a necessidade mais premente nos dias de hoje? Olhando ao nosso derredor, vemos centenas de famílias desempregadas, cujos chefes vivem o terrível drama do desemprego. Alhures, em países ditos do Primeiro Mundo, a globalização da economia está resultando em riqueza e bem-estar social, como nunca os houve na história. Mas em outros como no Brasil seus resultados têm sido negativos, carregando, para fora de suas fronteiras, os recursos gerados com o suor e sacrifício de seus cidadãos.
             Em tal quadro, os que ainda têm o privilegio de estar trabalhando, vislumbram um futuro incerto e sombrio, quanto ao trabalho, pois a crise sócio-econômica parece se aprofundar com o passar dos dias. Tem-se a impressão de que o modelo de civilização, que experimentamos neste final de século, está passando por uma forte transição que implicará mudanças profundas no mercado de trabalho.
             Se nos colocarmos no lugar de um pai ou mãe de família, que vive a angústia e o desespero de não ter como comprar alimentos, pagar aluguéis, água e luz, logo nos apercebemos tratar-se de situação extremamente grave. O trabalho que deveria ser o que demais certo existisse no contexto do humano, hoje é marcado pela estigma da insegurança e da incerteza, gerando medo e pavor quanto ao futuro.
             Por outro lado, a paz e a tranqüilidade sociais se vêem ameaçadas, pois o desespero e a falta de perspectivas podem levar à prática da violência, com o objetivo de se encontrar a solução para a sobrevivência, custe o que custar. Como não se pode freiar a marcha da História, nem mudar-lhe os rumos da noite para a dia, urge que coloquemos todo o potencial do Rotary em alerta e em ação, para se encontrarem, alternativas de fontes de trabalho e de renda familiar para o contingente de desempregados que povoam nossas cidades.
             Pior que a crise,  é o estado de espírito daqueles que pensam que nada se pode fazer. Resultado disso, é a acomodação e a desesperança. Vivemos numa sociedade em que a competitividade parece ter chegado a seu extremo. Em tal contexto, que a única alternativa de sobrevivência dos mais fracos, salvo melhor juízo, é a ação solidária, que pode ser institucionalizada.
             O panorama sócio-econômico que atualmente descortinamos no Brasil entristece-nos e nos constrange. 0 país de pires na mão diante do FMI; alto índice de desemprego; uma dívida externa e interna enorme, cujos juros devoram suas receitas. Em conseqüência, setores essenciais como o da saúde e educação se deterioram, de forma acelerada. Do alto de sua autoridade, o Governo força a massa de assalariados a apertar o cinto. 0 arrocho tem sido tamanho, a ponto de comprometer, não só a manutenção de nossas estruturas de serviços sociais, como a qualidade de vida, dos cidadão.
             Pergunta-se: concretamente, o quê se pode e o quê se deve fazer, para remediar uma situação gerada no bojo da História, ao longo de muitos anos e da qual somos também protagonistas? Reverter essa difícil situação depende apenas de uma minoria, na qual os rotarianos estão inseridos, formada por aqueles poucos homens que lutam por um mundo melhor, mais equânime, mais justo e mais fraterno. Homens que lutam para que o social acompanhe o desenvolvimento técnico-científico da humanidade, fazendo com que o desenvolvimento traga o bem estar ao ser humano, proporcionando-lhe uma vida digna de ser vivida.
             Com a sua experiência adquirida em quase 100 anos de trabalho em prol desse mundo melhor, o Rotary tem as condições necessárias para fazer essa conscientização, não só pelos exemplos que dá, mas principalmente pelo trabalho que executa. São os rotarianos que nos mostram que ainda existe uma, esperança e que ainda há uma luz no fim do túnel. Porém meus amigos, nós  que fazemos parte de uma autêntica família, que temos como base e a própria razão de ser, do Rotary International, ou seja; o Ideal de Servir, jamais poderemos permanecer alheios a essa situação de desmando, de anarquia administrativa, de safadeza, de comodismo e acima de tudo, de malandragem política, pois, servir enquanto valor humanístico universal acentuado em todas as grandes religiões da história não se restringe a gestos emocionais e episódicos.
             Se uma das condições que determinam o progresso de uma sociedade, está na capacidade de suprir respostas viáveis aos problemas que atingem o povo, fica evidente que o cidadão maduro, o brasileiro esclarecido, e, particularmente, o rotariano de primeira linha, caracterizam-se pelo espírito de serviço permanente e perspicaz. Frente à frente com um jovem subjugado pela desgraça, pelo álcool, pela droga; frente à frente com um pai de família desempregado;  frente à frente com um menor abandonado; frente à frente com a mulher explorada e decaída, ele saberá prestar não apenas ajuda imediata e direta senão também o serviço maior, que é atacar as raízes profundas desses problemas sociais.
             Esmolas ocasionais não construirão nunca a tão necessária ordem social neste país. Melhores condições econômicas, embasamento digno da vida familiar, mais escolas, moradia para todos, tudo isso exige serviço inteligente e desprendido de elites apaixonadas pela pátria como de ser Rotary Club. Rotariana, rotariano, esta é a tua tarefa de cristão, de cidadão e de contribuir para que o amor e a liberdade de Cristo procedam a todos a manifestação da vida moderna, a cultura e a economia , o trabalho e o descanso e vida em família, o convívio social. Meus amigos, permitam-me contar- lhes uma pequena história.
             “Um homem percorria, certa vez, as obras de um grande templo que estava sendo edificado. Andando por entre os operários que trabalhavam a pedra para a construção monumental, ele se deteve diante de um trabalhador que, de  martelo na mão batia os blocos a seu cargo. Dirigindo-lhe a palavra, o visitante perguntou o quê fazia: “Eu bato pedras, respondeu o trabalhador; sem maior interesse”.
             Recebida a resposta, o visitante prosseguiu no seu percurso, caminhando por entre as tendas de trabalho até acercar-se de um outro operário, ao qual ofereceu a mesma  pergunta. A resposta foi diferente: “Eu estou ganhando a minha vida”. Respondeu o homem que trabalhava a pedra.
             Nova caminhada, no pátio de obras logo adiante, até que em frente ao terceiro trabalhador, igualmente ocupado com o mesmo trabalho, perguntou-lhe, da mesma maneira que aos demais:  “O quê estava fazendo?” E o trabalhador, com entusiasmo, sem disfarce, respondeu-lhe animado: “Eu estou construindo uma catedral.”
             Eis aí meus amigos, três atitudes, que pode um homem adotar em face da profissão a que se dedica. Três atitudes diferentes, mas não excludentes. De qualquer maneira a profissão é necessária. Ela é uma necessidade natural da vida humana, como o entretenimento de forma psicológica, que na infância é brinquedo, e na idade adulta é trabalho. É isto, mas não é só isso. É também um instrumento de sustentação econômica, de que todo indivíduo  precisa para viver e desempenhar a função social a que se entrega, na interdependência imposta pela vida em comum.
             O homem que definiu o seu trabalho, só pela rotina de quebrar a pedra, era tão pobre perante o segundo que o definiu como sustentação própria e do seus. Como pobre era por sua vez esse segundo, na presença do terceiro, aquele  que punha também fé  no ideal do seu trabalho. É o trabalho, o avesso do ócio. O meio digno, que o  cristianismo consagrou  para a sustentação própria e dos dependentes. Imposição da conjuntura socio-econômica da vida coletiva, a que não se escapa. Independentemente de sua função profissional, pode ser o instrumento para a sua realização pessoal, atendendo as exigências psíquicas e correspondendo as  condições do meio social. Mas tudo que merece ser feito, merece ser bem feito. Com capricho, a versão estética da responsabilidade.
             Rotary, nossa secular e sempre atualizada instituição nascida sob a inspiração do trabalho profissional, a serviço do homem e do bem comum, nos congrega para aliarmos ao melhor desempenho da profissão, uma preocupação com que é justo no interesse coletivo. A prestação de serviços à comunidade, o dar de si sem pensar em si, o esforço para ser útil, na conciliação do legítimo interesse próprio com a necessária solidariedade social, tudo sob a égide da ética profissional, caracterizam roteiro de vida e de ação do rotariano olhando sempre além de si mesmo.
              Neste momento, queria lançar um desafio a todos, reproduzindo esta história  denominada:  “Você decide.”
             “O garoto morava numa pequena cidade do interior. Todos os dias freqüentava a escola que ficava a alguns quilômetros dali, percorrendo rotineiramente uma estradinha arborizada. Apanhava goiabas, quando era tempo, e as levava para comer, na hora do recreio. Às vezes, laranjas. Seu mundo era seguro, imutável, garantindo a perenidade das coisas e dos valores que aprendia. Como um rio bastava seguir sua trajetória para chegar ao mar. Na cidade grande, o jovem conquistou um diploma de nível superior e novos paradigmas e certezas.
             Alguns anos depois, ele e seu carro voltaram. Queria matar saudades e foi percorrer a tal  estradinha que o conduziu à escola e Ihe deu goiabas e laranjas. Surpresa! Ela não estava mais lá. O local fora transformado num condomínio de luxo. 0 rapaz, no entanto, não percebeu a mudança. Indignado e cego enfiou o carro contra o muro, como quem força um “flash-back”. Além do prejuízo, um duro aprendizado.”
             Muitos desempregados não perceberam a mudança de cenário e permanecem presos ao paradigma da estradinha: o emprego e suas goiabas e laranjas para o recreio. Ao perceberem que o antigo caminho já não existe, limitam-se a chorar, enquanto desenvolvem um senso de auto piedade, certos de que o passado um dia voltará. A culpa de tudo segundo eles, fica dividida entre Deus e a raça humana.
             Mude  esse script, para que a história tenha um final feliz. Ao invés de limitar-se a mandar alguns currículo, encerrando--se em casa dentro do pijama, barba por fazer e sessão da tarde correndo solta, que tal assumir que seu trabalho agora e procurar  criar, descobrir o quê fazer? Fale com outras pessoas, gente com quem você pode fazer parceria, mesmo sem registro em carteira. Abandone a idéia fixa de sofrer, porque acabaram com sua estradinha predileta. A vida não se resume nisso. Descubra novos caminhos, as respostas estão por aí, faça as perguntas certas para encontrá-las. Como você sabe, quando um problema aparece ele traz , em si mesmo, os ingredientes para a solução.
             Deixe de procurar emprego e a proteção daquelas árvores frondosas, com seus frutos sempre disponíveis. Passe a buscar trabalho. Descubra a outra metade da sua laranja profissional. E comece logo,  mesmo que pequeno. Apenas não prive-se do direito de sentir-se feliz, útil, produtivo, só porque a velha estradinha, já não existe.  E sinta-se gratificado por superar barreiras e por tabela ajudar alguém a encontrar seu espaço no mercado.
             Só existem duas saídas: você pode sentar-se e lamentar-se, culpando a crueldade do destino, enquanto morre de desgosto e de  fome. Mas tem o caminho aberto para tomar outro rumo e fazer descobertas inesperadas e até mesmo  interessantes e até criando chances para outros.
             O final da história, vocês decidem.
             Meus amigos ao finalizar, diria que o Rotary não tem o poder dos governos. Não tem a força dos exércitos. Não tem o dinheiro das grandes corporações e, nem mesmo possui a mística das religiões, que prometem a vida eterna. Mas, o Rotary possui a fé e o entusiasmo de homens e mulheres livres, líderes e voluntários que estão dispostos a oferecer algo o de si em favor de um mundo melhor.
             Para tornar menor a herança que nos deixará o século XX, será necessária a união de todos, muita persistência, muita vontade e muito denodo, pois será no século XXI, que o Rotary testará a sua capacidade e força moral na consecução do objetivo  que ele almejou:  a união da família, a difusão das normas de ética profissional e a paz mundial, tornando tudo isso real o nosso sonho de Rotary. Muito obrigado.