Setembro de 1990

 CELULOSE DE NATIVAS?

 A irreversível onda verde, desencadeada no mundo todo, traz em seu bojo uma série de distorções motivadas pela ignorância, oportunismo político ou comercial e má-fé. Um exemplo de oportunismo comercial está acontecendo nos países desenvolvidos e que são importadores de celulose, papel e chapas de fibras do Brasil: dentro da "campanha de salvação da Floresta Amazônica", os consumidores são instados a não utilizarem aqueles produtos "made in Brazil" pois, na obtenção dos mesmos, são utilizadas madeiras da floresta tropical. Nessa linha, empresas brasileiras da área celulósica-papeleira recebem, com frequência, consultas de clientes do exterior, acerca das distâncias da Floresta Amazônica até as fábricas!

Outras empresas precisam fornecer "declarações formais" de que não utilizam madeira de nativas na obtenção dos produtos. Outras, ainda, afixam adesivos, nos fardos de celulose e bobinas de papel, para exportação, afirmando que "este produto é fabricado exclusivamente com madeiras obtidas em reflorestamento". Na área de chapas de fibras de eucalipto (100%) empresas exportadoras estão encontrando dificuldades na colocação daquelas pintadas com padrões imitando algumas nativas como o jacarandá-da-Bahia, sucupira, cerejeira, etc. Será pura ignorância do consumidor no exterior ou campanha orquestrada que insinua que estas madeiras são usadas como matéria-prima? Como veremos a seguir, existem razões suficientes para que a campanha seja desencadeada na órbita comercial, passe para o nível político, extravase para a ignorância e desague na má-fé. 

Neste artigo vamos nos ater ao componente comercial. O Brasil é o oitavo produtor mundial de celulose e o décimo primeiro produtor de papel. Nos últimos anos, atingiu a honrosa posição de primeiro produtor a exportador de celulose branqueada de eucalipto. Nos próximos cinco anos deverá dobrar sua capacidade de produção de celulose devendo atingir quase 8 milhões de toneladas anuais.

Ainda que expressiva, esta produção deverá representar a modesta marca de 4 a 5% da cifra mundial. Nessa oportunidade, os cinco maiores produtores (Estados Unidos, Japão, Canadá, Suécia e Rússia) deverão representar 70% do total. A produção brasileira de celulose está apoiada em madeiras de eucalipto e pinheiro (gênero Pinus) em torno de 95%. Os restantes 5% são representados por bambu, bagaço, gmelina, acácia e outras matérias-primas regionais (plantas anuais e resíduos agrícolas). Diferentes espécies de eucalipto e pinheiro foram introduzidas com objetivos múltiplos e hoje se constituem nas principais matérias-primas para uso industrial.

Do ponto de vista florestal, essas espécies se destacam pela adaptabilidade a diferentes condições de solo e clima, facilidade de regeneração por sementes ou propagação vegetativa de estacas, rápido crescimento e custo compatível com a atividade industrial. Do ponto de vista fabril, as espécies desses gêneros são preferidas pela homogeneidade que pode ser obtida e controlada, qualidade da madeira adequada ao processamento e requisitos do consumidor dos mercados interno e externo. 

Com os trabalhos de pesquisa desenvolvidos nos diferentes setores da área florestal (melhoramento, silvicultura, exploração entre outros) e progressos alcançados pela tecnologia industrial de produção de celulose e papel a partir de espécies de rápido crescimento, o Brasil se destaca no cenário mundial apesar da modesta participação percentual citada. A utilização de misturas de madeira de florestas tropicais, no Brasil, nunca passou de esparsas tentativas a nível de laboratório e escala piloto.

Os resultados são unânimes em apontar uma série de dificuldades que colocam as "nativas" em franca desvantagem se comparadas com as "exóticas" citadas: heterogeneidade das florestas quanto às espécies recomendadas; qualidade de madeira extremamente variável; distância dos atuais centros de utilização ou consumo; dificuldade de extração, transporte e preparo para utilização industrial (descascamento, picagem, armazenamento, etc.); economicidade da atividade florestal e industrial pelo descarte de espécies não-utilizáveis para celulose; variações da qualidade do produto final, etc.

Frente a este quadro, o Brasil assusta os tradicionais países produtores/exportadores de celulose e papel não pelo que representa, no momento, mas pelo seu potencial: imaginem se, um dia, resolver abdicar de sua posição de "deitado eternamente em berço esplêndido"! 

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